Acir perde ação contra Folha da Manhã. Na ação, o senador pedia indenização de R$ 100 mil. Desembargador votou pelo não provimento.

9 de dezembro de 2019 312
ESTADO DE RONDÔNIA 

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

2? C?mara C?vel / Gabinete Des. Paulo Kiyochi

 

 


 

Processo: 7010579-54.2018.8.22.0005 - APELA??O C?VEL (198)

 

Relator: PAULO KIYOCHI MORI

 

 

 

Data distribuição: 10/09/2019 08:47:16

 

Data julgamento: 23/10/2019

 

Polo Ativo:  ACIR MARCOS GURGACZ e outros

Advogado do(a) APELANTE: EDUARDO RODRIGO COLOMBO - PR42782-A

Polo Passivo: EMPRESA FOLHA DA MANHA S.A. e outros   

Advogado do(a) APELADO: TAIS BORJA GASPARIAN - SP74182-A

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Acir Marcos Gurgacz na "ação de indenização por danos morais c/c pedido de tutela de urgência" contra Empresa Folha da Manhã S/A (Folha de São Paulo), em que o juízo a quo julgou improcedentes os pedidos iniciais, condenando-o ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios em 10% sobre o valor da causa.

Consta da exordial que o requerente é Senador da República do Estado de Rondônia, com reputação profissional e imagem pessoal ilibada, exercendo sua função pública com zelo e dedicação, sendo reconhecido e respeitado no cenário político nacional.

Relata que a requerida teria publicado notícia de forma distorcida e com informações incompletas, objetivando denegrir sua imagem, ao afirmar que teria sido acusado de comprar ônibus velhos e se apropriar de R$525.000,00 (quinhentos e vinte e cinco mil reais).

Explica que a notícia não menciona a defesa apresentada, tampouco que referida assertiva constou apenas da denúncia e não se confirmou, restando evidente que houve abuso no direito de informar.

Inconformado, o apelante aduz que a matéria tem alcance nacional, tendo repercutido em todos os telejornais, destacando trecho da acusação sem esclarecer os aspectos da contestação ou defesa.

Argumenta que a matéria é ofensiva e faz imputação de crimes de corrupção ativa, estelionato e peculato, de maneira pejorativa.

Assevera que, em nenhum momento, se apropriou de qualquer valor, pois era apenas avalista do empréstimo da empresa Eucatur.

Defende que o acórdão que o condenou parcialmente não menciona a apropriação de R$525.000,00, como tenta fazer crer a matéria veiculada.

Sustenta que deve prevalecer o princípio da presunção da inocência, assim, sua culpabilidade somente será demonstrada após um processo concluído.

Discorre acerca da configuração dos danos morais.

Por fim, pugna pela reforma da decisão, invertendo-se os ônus sucumbenciais e condenando a apelada ao pagamento de indenização no valor de R$100.000,00 (cem mil reais), custas processuais e honorários de sucumbência.

Contrarrazões pelo não provimento do recurso.

É o relatório.

 

 

VOTO

DESEMBARGADOR KIYOCHI MORI

 

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Pretende o apelante a reforma da sentença que julgou improcedente o pedido de indenização por danos morais decorrentes de publicação de matéria no sítio eletrônico da apelada.

A liberdade de expressão assegurada pela Constituição da República (art. 5º, IV e IX) deve respeitar, entre outros direitos e garantias fundamentais, a honra das pessoas, sob pena de indenização por eventual dano moral provocado (art. 5º, V e X).

Deve-se ponderar dois princípios fundamentais, o direito a informação (art. 220 da CF) e a inviolabilidade da intimidade (art. 5º, inc. X da CF). Assim, se a notícia for abusiva, ferindo direito alheio, fica configurada a prática de ato ilícito. Por outro lado, se houver um interesse público por trás da informação, aquele direito do cidadão cede ante a necessidade de tutelar a coletividade.

Desse modo, resta analisar a existência de ofensa à honra e moral do apelante.

Para melhor compreensão e elucidação dos fatos, transcrevo a matéria publicada no dia 27/2/2018 (Id n. 6968104):

STF condena senador Acir Gurgacz a prisão e perda de direitos políticos

A Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) condenou o senador Acir Gurgacz (PDT-RO) por crime contra o sistema financeiro nacional a quatro anos e seis meses de prisão em regime semiaberto e perda dos direitos políticos, que deve ser submetida à análise do Senado.

Os ministros também decidiram que ele deve pagar multa. O Senador foi absolvido da denúncia por crime de estelionato.

Os ministros definiram que a perda do mandato é uma atribuição do Senado. Como o regime inicial ao qual ele foi condenado é o semiaberto, não há perda automática de mandato.

Segundo seu advogado, Thiago Machado, ele pode terminar o atual mandato, que ainda demora quatro anos. A defesa vai recorrer da condenação.

Esgotados os recursos, a condenação precisa passar pelo aval do plenário do Senado.

Procurada, a presidência da Casa disse que não comentaria o caso.

De acordo com o PGR (Procuradoria-Geral da República), entre 2003 e 2004 Gurgacz obteve financiamento junto ao Banco da Amazônia mediante fraude.

O dinheiro serviria para renovar a frota de ônibus da Eucatur, uma empresa de transporte cuja filial era gerida por ele mesmo.

De acordo com a denúncia, o senador teria se apropriado de R$ 525 mil da verba de R$ 1,5 milhão liberada pelo banco. O restante da quantia, segundo a PGR, foi usado para comprar ônibus usados, e a prestação de contas foi feita com a apresentação de notas fiscais falsas.

O delito foi enquadrado como desvio de finalidade de recursos provenientes de financiamento concedido por instituição financeira oficial. Ele foi condenada por esse crime.

Relator do caso, o ministro Alexandre de Moraes votou pela condenação do senador com o argumento de que os valores deveriam ter sido integralmente aplicados na compra de veículos novos, uma vez que o financiamento do banco serviria para renovar a frota da empresa. Ele foi acompanhado pela maioria dos magistrados.

"A acusação de que o senador teria desviado qualquer valor foi afastada, só sendo reconhecido que não aplicou os recursos dentro da finalidade que teria sido imposta pelo contrato", disse Machado à Folha.

O Estado de Rondônia tem dois de seus três senadores condenados pelo STF. O outro é o Ivo Cassol (PP), que concluirá o mandato neste ano apesar de ter sido condenado em 2013 pelo STF.

A corte levou quatro anos para julgar um recurso que, em tese, não poderia modificar a pena.

Devido a um empate em julgamento realizado no final de 2017, sua pena passou de regime semiaberto para aberto. Ou seja, a prisão foi substituída por prestação de serviços.

OUTRO LADO

Em nota, o senador disse que considera "injusta" a decisão da primeira turma do STF e que irá recorrer ao plenário do Supremo.

"[O senador] está confiante de que será inocentado, pois além de não ter participação direta na captação do empréstimo, toda operação de crédito foi quitada na época e considerada regular pelo Banco da Amazônia, como mostra laudo de perícia feito pelo banco", diz o texto.

Sua assessoria afirma ainda que o empréstimo foi feito em 2003, "quando Acir estava afastado das atividades administrativas da empresa, não ocupava nenhum cargo público e assinou o contrato apenas como avalista".

In casu, vislumbra-se que a matéria limitou-se a relatar fatos comprovadamente ocorridos, não expressando juízo de valor.

Nota-se que, apenas houve a divulgação de situação relevante para a sociedade, uma vez que a matéria jornalística narrava os acontecimentos relativos a denúncia e pena de prisão do apelante, pessoa pública exercendo o cargo de Senador da República.

Ademais, referida reportagem não deixou de mencionar a defesa do apelante, inclusive mencionando a declaração prestada por sua assessoria.

Vê-se, assim, que o ato da parte apelada, consubstanciado no serviço de informar à sociedade, foi exercido de forma regular, com observância ao interesse público e social e em estrita obediência ao art. 220 da Constituição Federal, sem qualquer excesso capaz de ensejar o dever de indenizar.

O abuso de imprensa em matéria jornalística somente tem o condão de ensejar indenização se a notícia veiculada tem a conotação de injúria, difamação ou calúnia, ou quando das referências, alusões e frases publicadas sobressai a conotação pejorativa, o que não ocorreu na hipótese.

Nesse sentido, cito os seguintes precedentes desta Corte:

Ação indenizatória. Divulgação de notícia em site jornalístico. Ofensa à honra. Inexistência. Ausência de excesso no ato. Dano moral. Não configurado. Sentença mantida. Honorários recursais. Majoração de ofício.

Verificado que a matéria jornalística não efetuou juízo de valor ou causou abalo a aspectos subjetivos da pessoa, inexiste dano moral decorrente da divulgação da matéria. [...] (Apelação n. 7009246-67.2018.822.0005, Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, Rel. Des. Marcos Alaor Diniz Grangeia, j. 4/9/2019).

Responsabilidade civil. Indenizatória por danos morais. Programa de TV. Veiculação de matéria jornalística. Dever de informar não ultrapassado. Dano moral inexistente.

Descabe indenização por danos morais quando a matéria jornalística se limita a noticiar os fatos sem qualquer abuso, ante a garantia da liberdade de expressão.

A reportagem veiculada limitou-se a narrar fatos de interesse público, não possuindo, pois, o condão de lesionar a honra da autora, mas, antes, assegurou o direito à liberdade de informação que deve ser garantido a todo cidadão (Apelação n. 7009463-56.2017.822.0002, Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, Rel. Des. Raduan Miguel Filho, j. 5/6/2019).

 

Apelação cível. Juiz destinatário da prova. Julgamento antecipado da lide. Preliminar de cerceamento de defesa rejeitada. Publicação de matéria em TV. Limites da liberdade da imprensa de prestar informações obedecidos. Dano moral não configurado.

[...] Vislumbrando-se que a matéria publicada em TV deixou de efetuar juízo de valor, bem como obedeceu os limites da liberdade da imprensa de prestar informações, não pode ser considerada ofensiva e ensejadora de indenização por danos morais. (Apelação n. 7013375-80.2016.822.0007, Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, minha relatoria, j. 25/4/2019).

Dessa forma, inexistindo demonstração de que a recorrida ultrapassou os limites do direito de informação, visto que não comprovado o intuito ofensivo, não fica caracterizado o dano moral.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso e majoro os honorários advocatícios de 10% para 12% do valor da causa.

É como voto.

EMENTA

Apelação cível. Publicação de matéria jornalística. Limites da liberdade da imprensa de prestar informações obedecidos. Dano moral não configurado.

 

Vislumbrando-se que a matéria publicada deixou de efetuar juízo de valor, bem como obedeceu os limites da liberdade da imprensa de prestar informações, não pode ser considerada ofensiva e ensejadora de indenização por danos morais.

ACÓRDÃO

 

                        Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Magistrados da 2? C?mara C?vel do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, na conformidade da ata de julgamentose das notas taquigráficas, em, RECURSO N?O PROVIDO NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, ? UNANIMIDADE.

 

 

Porto Velho, 23 de Outubro de 2019 

 

 

 

 

Desembargador(a)   PAULO KIYOCHI MORI

 

RELATOR