‘Agora sou uma ideia’
A carta do ex-presidente Lula que o JB publica hoje, com suas muitas camadas de sentido, traduz de forma mais elaborada o que ele disse no ato de 7 abril, horas antes de ser preso: “agora eu sou uma ideia”. Focando um tema específico, o projeto de lei que autoriza a Petrobras a vender o excesso de produção em seus campos de cessão onerosa, Lula reapresenta as linhas gerais do projeto nacional-desenvolvimentista que liderou, fortemente ancorado na defesa da soberania e na inclusão, uma “ideia” que ele encarna mais do que ninguém.
E ao fazê-lo, explicita o que será uma das linhas fortes do discurso de campanha do PT, e por isso o artigo poderia ter outro título: “agora sou candidato”. Quem Lula aponta como responsável pela quebra da soberania, pelo entreguismo e pela agenda ultraliberal em curso, não é Temer, que nem menciona, mas o PSDB. Lula associa o partido diretamente à gestão de Pedro Parente na Petrobras, à Lei Serra, que dispensou a estatal de participação obrigatória na exploração do pré-sal, e à “política externa dos chanceleres tucanos, ditada pelo Departamento de Estado dos EUA, num retorno vergonhoso ao complexo de vira-latas que tínhamos superado em nosso governo”.
Ao desancar a permissão de venda da cessão onerosa, conclamando a sociedade a reagir e o Senado a derrotá-lo, Lula refresca memórias, inclusive do empresariado, sobre o que foi seu governo: a cessão onerosa foi iniciativa sua, que permitiu à Petrobras valorizar-se e capitalizar-se para a rápida exploração do pré-sal, que já responde por metade da produção nacional de petróleo.
Adquirindo estas áreas, diz ele, as petroleiras estrangeiras “vão comprar sondas e plataformas lá fora, sem gerar um só emprego na indústria brasileira. Vão contratar engenheiros e técnicos lá fora; vão controlar diretamente toda a inteligência de pesquisa e exploração em nosso pré-sal, o que também é um ataque a nossa soberania. ”
E assim Lula recordou indiretamente a política de conteúdo nacional, que fez a alegria da indústria nativa, hoje praticamente suprimida, e o boom da indústria naval, hoje moribunda. Foram acenos sutis a aliados perdidos. Se o mercado tem alergia a Lula, o setor produtivo nacional perdeu o rumo: rompendo a aliança com o PT para apoiar o impeachment, amargou o aprofundamento da recessão e o fiasco do governo Temer em todos as frentes. Ciro tem projeto mas segue isolado. Marina e Alckmin abraçaram o neoliberalismo. Bolsonaro é o escuro do abismo.
Falando como candidato pronto para o embate, Lula passou ao largo da prisão que considera injusta e politicamente motivada. É como “ex-presidente e pré-candidato do PT à presidência da República” que assina o artigo. Promete, no final, sem apontar os meios, “reverter tudo que estão fazendo contra nossa gente, contra os trabalhadores e contra o País. E o Brasil vai voltar a ser dos brasileiros. ”
Mas, ao dizer que “o tempo deles acaba em outubro”, emenda de modo sintomático: “quando o Brasil vai eleger um governo democrático, com legitimidade para reverter a agenda do entreguismo, do ultraliberalismo, que só interessa ao mercado e não ao país ou ao nosso povo. ” Não diz que o eleito será ele, nem que será do PT. Deixou aí a fresta aberta, seja para o candidato petista B, seja para as alianças que forem necessárias no segundo turno. Pontuou, principalmente, que futuro governo só será legítimo se ele participar do pleito. Ou, como tem dito em outras ocasiões, que o derrotem nas urnas, não com as grades.
Coincidentemente saiu ontem a pesquisa Ibope/CNI, em que Lula lidera com 33%, mais que o dobro das intenções de voto em Bolsonaro (15%). Sem ele, Bolsonaro (17%) e Marina (13%) estariam em forçado empate técnico. Mas quem lidera mesmo neste caso é não-voto, os 41% que botariam branco, nulo ou em ninguém.
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A POLITICA COMO ELA é (POR : TEREZA CRUVINEL)
Tereza Cruvinel atua no jornalismo político desde 1980, com passagem por diferentes veículos. Entre 1986 e 2007, assinou a coluna “Panorama Político”, no Jornal O Globo, e foi comentarista da Globonews. Implantou a Empresa Brasil de Comunicação - EBC - e seu principal canal público, a TV Brasil, presidindo-a no período de 2007 a 2011. Encerrou o mandato e retornou ao colunismo político no Correio Braziliense (2012-2014). Atualmente, é comentarista da RedeTV e agora colunista associada ao Brasil 247; E colaboradora do site www.quenoticias.com.br