CRER OU NÃO CRER - EIS A QUESTÃO !

23 de janeiro de 2018 724

Crer/ é refinar/ o ceticismo/ Toda lâmpada revela/ um novo abismo/ À luz dela/ luz vem atrás/ Luz basta à mente/ para luzes mais/ Desse oco à beira/ cujo medo apraz/ pela vida inteira/ recende paz/ Mas/ paz é luz de vela/ que ascende e deflagra/ para morrer à luz/ de maior estrela/ que também se apaga”.

Já fui muito crente.

Hoje tenho fé de que não mais volte a ser.

Esclarece-me o facho de fanatismos à volta.

Assim descrente, luzem tempos memoráveis em que não era necessário o apego a nomenclaturas que nos erguessem o nariz diante de outros narizes. Preferíamos os narizinhos nivelados pra cheirar o lanche do outro antes de pedir um teco.

Queríamos cochichar nenhuma improbidade nos ouvidinhos perfilados.

Àquela altura da vida e de tocos de gente, não nos cobravam posturas a não ser, no meu caso de menina, que mantivesse “as perninhas fechadas ao sentar”; “a boquinha fechada ao mastigar”; os “cabelinhos penteados ao sair”. Simplicidades tais e quais.

É verdade que era um porre ter que cumpri-las, haja vista tudo distrair-nos já que tudo – absolutamente tudo! – nos encantava e, portanto, urgia!

Tudo que não fosse encantamento nos aborrecia. Obrigações tipo comer, estudar, dormir.

E inconscientemente: crescer. Crescer era aborrecível na medida do dia a dia sem que disso nos déssemos conta, pois, não contávamos.

Contávamos, ao contrário, com alguma magia, uma providência que providenciasse, portanto, nossa permanência exatamente ali onde estávamos, exatamente ali como éramos.

Confiávamos, imagino, em algum congelamento. Algo assim.

Ou não. Vai ver não confiávamos nem nisso nem naquilo.

Não desconfiávamos – isso sim.

E por que razão desconfiaríamos, se o mundo era a extensão do supostamente jamais cansado colo materno, cuja idade macularia; da supostamente inabalável sombra paterna que os anos cuidariam de envergar; dos deliciosos perrengues com os irmãos que com perrengues outros viriam conflitar; dos ingênuos primeiros amoricos que durariam toda vida não fosse a vida “a vida como ela é”; das supostamente eternas amizades que uma mudança de bairro ou rua, que uma mudança de colégio ou trabalho tornariam lembrança?

Por que, enfim, desconfiaríamos?

 

 

 

Valquíria Gesqui Malagoliescritora e poetisa, vmalagoli@uol.com.br