DALLAGNOL: Eduardo Cunha Está Preso Há Um Ano. Semana Que Vem, STF Julga Recurso Em Habeas Corpus. Esperamos Que Continue Preso

19 de outubro de 2017 910

A ascensão e queda de Eduardo Cosentino Cunha em Brasília levou 13 anos, em quatro mandatos de deputado federal, a partir de 2003. Sua incursão na política, porém, começou ainda na década de 80, quando trabalhou nas campanhas de Eliseu Resende, do Partido Democrático Social (PDS), para governador de Minas, em 1982, e de Moreira Franco (PMDB-RJ), para governador do Estado do Rio, em 1986. Mas foi com a ajuda de Paulo César Farias, o PC Farias, tesoureiro da campanha de Fernando Collor (PRN-AL) à Presidência da República, em 1989, que Cunha ingressou para valer na vida pública, como presidente da estatal de telecomunicações do Rio, a Telerj, em 15 de fevereiro de 1991, após ter se filiado ao PRN. No ano seguinte, ele foi acusado de ter participado da rede de captadores de recursos ilegais junto a empresários, conforme reportagem publicada pelo GLOBO em 14 de junho de 1992. Na ocasião, Cunha negou qualquer participação no esquema de PC Farias, classificando a acusação de “totalmente mentirosa”.

Sua passagem pela Telerj foi pontuada por denúncias de irregularidade em licitação, negadas por Cunha, que apresentou números positivos de sua administração, qualificando-a de transparente. Com a queda de Collor, o presidente Itamar Franco o substituiu por José de Castro Ferreira, em 1993. Carioca, nascido em 20 de setembro de 1958, Cunha trabalhou por algum tempo como corretor na Bolsa de Valores do Rio e consultor de empresas. Aproximou-se do então ministro da Fazenda e deputado federal, Francisco Dornelles, filiando-se ao Partido Progressista Brasileiro (PPB), atual Partido Progressista (PP), em 1995, e do empresário Francisco Silva, deputado federal mais votado no Rio e dono da rádio evangélica Melodia, que o apadrinhou. Silva o levou para cultos evangélicos e para a sua rádio, na qual Cunha lançou o bordão “O nosso povo merece respeito”, além de tê-lo indicado a Fernando Henrique Cardoso, em 1995, para novamente presidir a Telerj. Mas Danilo Lobo foi o escolhido, e a empresa, privatizada em 1998.

Nesse período, Cunha estreitou relações com o governador do Rio Anthony Garotinho (1998-2002), também ligado a Francisco Silva, que o convidou para ocupar a presidência da Companhia Estadual de Habitação (Cehab). Sua gestão, entre 1º de outubro de 1999 e 10 de abril de 2000, foi cercada por denúncias de irregularidades. Em março de 2000, reportagens das revistas “Época” e “Veja” mostraram que parte da área administrativa do governo estadual estava envolvida em acusações de tráfico de influência e licitações fraudulentas até desvios de taxas cobradas por cartórios. Em 6 de abril, O GLOBO noticiou que os deputados estaduais Paulo Melo (PSDB), Solange Amaral (PTB) e Chico Alencar (PT) haviam recebido um dossiê anônimo descrevendo irregularidades na Cehab, num esquema de propinas que arrecadaria R$ 1 milhão por mês. A proposta de se realizar uma CPI da companhia foi derrotada na Alerj, tendo o apoio de apenas 14 dos 65 deputados presentes. Graças a articulações de Garotinho, Cunha, então suplente de deputado estadual, assumiu uma cadeira na Alerj, obtendo imunidade contra as investigações das irregularidades pelo Ministério Público, denunciadas em 2001 pelo Tribunal de Contas do Estado.

Em 2002, Cunha deixou para trás a política estadual e alçou voo rumo a Brasília, com os votos de mais de 100 mil eleitores, filiando-se em seguida ao PMDB. Na primeira legislatura, não ganhou visibilidade política, mas conseguiu reeleger-se em 2006, com 130.773 votos, quando começou a pôr em prática um estilo de atuação que daria muita dor de cabeça ao Planalto. Relator, em 2007, do projeto que prorrogava a CPMF até 2011, ele reteve a proposta durante três meses na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) até que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva nomeasse o ex-prefeito do Rio e seu aliado, Luiz Paulo Conde, para a presidência de Furnas. A demora teria contribuído para a derrota do governo petista na votação do imposto. Nesse mesmo ano, ampliou sua influência sobre os deputados para além da bancada fluminense, ao oferecer ao chamado baixo clero apoio jurídico no período eleitoral, ajuda em campanhas e espaço em comissões, formando uma rede de aliados.

Em 2009, durante a tramitação de projeto que mudava a distribuição dos royalties do petróleo, Cunha conseguiu a manutenção dos recursos com os estados produtores, como o Rio, com uma manobra regimental, que impediu a votação da proposta, e no ano seguinte foi reeleito com 150.616 votos. Em 2013, exibindo habilidade como articulador político, foi eleito líder do PMDB na Câmara. Um ano depois, entrou com uma queixa-crime no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contra o ex-aliado Anthony Garotinho (PR-RJ), por injúria e difamação. Em seu blog, o deputado Garotinho referiu-se a Cunha como “deputado-lobista”, por uma suposta atuação do parlamentar em favor de empresas dos setores de energia, telefonia e construção civil. Mesmo assim, em 2014, seu eleitorado lhe deu 232.708 votos. Simultaneamente à atuação no Congresso, Cunha manteve seu trabalho como radialista em sete emissoras FM em São Paulo, Piauí, Paraná e Rio de Janeiro.

Sua eleição para a presidência da Câmara, em fevereiro de 2015, logo após a posse de Dilma Roussef em seu segundo mandato, contrariou a presidente e o PT, que negaram apoio à sua candidatura, piorando uma relação já difícil. Mas seus adversários não estavam parados: no dia 3 de novembro, o Conselho de Ética da Câmara dos Deputados instaurou processo disciplinar com o objetivo de pedir a sua cassação. Em reação, aliados de Cunha começaram a tramitar no Congresso as chamadas pautas-bomba, com poder para desestabilizar o governo, e, finalmente, em 2 de dezembro de 2015, acolheu o pedido de impeachment de Dilma. A aceitação ocorreu horas após os três petistas integrantes do Conselho de Ética se recusarem a apoiá-lo contra um processo de cassação de mandato por quebra de decoro parlamentar, por ter mentido à CPI da Petrobras ao negar ter contas no exterior. Mas investigações indicaram que ele e a mulher, a jornalista Claudia Cruz, eram titulares de quatro contas na Suíça. Em abril de 2016, comandou o procedimento de impeachment de Dilma na Câmara, que decidiu pelo afastamento temporário da presidente, até seu julgamento definitivo pelo Senado.

Mas, aos poucos, a munição de manobras de Cunha foi se esgotando e, em 5 de maio de 2016, o Supremo Tribunal Federal (STF), em decisão unânime, afastou o deputado do mandato e da presidência da Câmara, ao referendar liminar do ministro Teori Zavascki. O magistrado atendeu ao pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, encaminhado em dezembro, por considerar que o político fluminense usava o cargo para obter propina e atrapalhar investigações contra ele. Após o afastamento definitivo de Dilma da Presidência pelo Senado, em 31 de agosto, ele viu-se novamente no centro das atenções políticas e, no fim da noite do dia 12 de setembro, Eduardo Cunha teve seu mandato e direitos políticos cassados pela Câmara até 2027, por 450 votos a 10, após 314 dias de manobras contra a cassação, no mais longo processo desse tipo na História do país.

Sem o foro privilegiado, Cunha, que foi citado por envolvidos na Operação Lava-Jato e é alvo de inquéritos, teve seus processos, que estavam no STF, encaminhados ao juiz Sergio Moro, que determinou sua prisão preventiva, ou seja, por tempo indeterminado, em Brasília, em 19 de outubro, pouco mais de um mês após a sua cassação. Em 30 de março, o juiz Sérgio Moro condenou Eduardo Cunha a 15 anos e quatro meses de prisão por corrupção, lavagem de dinheiro e evasão de divisas, em regime fechado. O crime de corrupção envolveu o recebimento de propina de US$ 1,5 milhão pela aquisição, pela Petrobras, de um campo de petróleo em Benim, na África, resultando em prejuízo de US$ 77,5 milhões à estatal.

Em 27 de julho de 2017, o Ministério Público Estadual deu entrada em ação civil pública contra Cunha, o doleiro Lúcio Bolonha Funaro e outras dez pessoas por improbidade administrativa. O grupo é acusado pelo MP de causar prejuízo de R$ 41 milhões ao fundo Prece, de previdência complementar dos funcionários da Cedae.