“EUA ganhariam 1,3 biliões se China respeitasse a propriedade intelectual”

Na guerra das tarifas, são onze contra onze e no fim ganham os Estados Unidos. “Acabemos de vez com elas”. O apelo é feito por Deborah Wince-Smith, presidente do US Council on Competitiveness, uma organização norte-americana que reúne CEOs, presidentes de universidades e cientistas que trabalha para aumentar a competitividade da economia dos EUA no mundo. Uma missão que está a ser atrapalhada pela guerra de tarifas comerciais que estoirou nos últimos meses. “As tarifas são obsoletas no atual contexto do comércio global e da concorrência. Deveríamos competir com base na qualidade dos nossos produtos e serviços e não com base nas barreiras que existem. As tarifas são coisa do século XIX ou XX”, afirma Debora Wince-Smith em entrevista ao Dinheiro Vivo.
A norte-americana é uma das convidadas da Horasis Global Meeting, uma conferência internacional que desde sábado reúne em Cascais mais de 600 participantes, entre empresários, políticos ou académicos. Wince-Smith trabalhou no Governo de Ronald Reagan e George W. Bush e é considerada uma das maiores especialistas norte-americanas em inovação e competitividade, tendo assento nos conselhos de administração de inúmeras empresas e universidades. Questionada no evento sobre as medidas protecionistas adotadas por Donald Trump e os seus efeitos a nível global, a responsável admite alguma “culpa” americana, mas rejeita o papel principal na guerra comercial. “O que me preocupa no comércio internacional hoje em dia é que não estamos a cumprir as regras da Organização Mundial do Comércio. Falo da China em particular, onde a propriedade intelectual, por exemplo, é roubada em massa. Faço parte da comissão de defesa da propriedade intelectual dos EUA e um dos nossos estudos revelou que se a China implementasse as leis da propriedade intelectual, o PIB dos EUA ganharia 1,3 biliões de dólares. Para fazer negócios na China as empresas têm de ceder a sua tecnologia. São barreiras enormes, que não são tarifas, mas que têm de mudar”, destaca Wince-Smith. Segundo a responsável, os Estados Unidos são um dos países mais afetados do mundo pelas tarifas impostas ao comércio de bens. “Não somos inocentes, também impomos tarifas à importação de vários produtos agrícolas. Protegemos o açúcar, por exemplo, o que é ridículo. Mas no geral, estamos em desigualdade porque as tarifas que impõem aos EUA são maiores do que as impomos aos outros países. Toda a gente diz que os EUA estão a ser protecionistas mas somos a economia mais aberta do mundo”, sublinha. Deborah Wince-Smith acredita que o pingue-pongue das tarifas vai resultar “numa séria reestruturação das relações entre os EUA e a China”, que será “mais grave para a China, porque dependem mais dos EUA do que os EUA da China”. Deixa também o recado à União Europeia: “Têm de agir de forma dura em relação a isto porque também estão a ser afetados”. “Portugal olha para o futuro, ao contrário da Grécia” Na terceira vez que visita Portugal, Deborah Wince-Smith revela estar atenta à evolução da economia lusa. “Portugal deu os passos mais dificeis para estabilizar a dívida e outras dificuldades que provocaram a crise. O setor financeiro ainda atravessa alguns desafios, mas existe aqui uma comunidade vibrante de startups e unversidades. Faço parte da direção de uma empresa de nanotecnologia e temos uma empresa portuguesa entre os fornecedores. Fiquei muito impressionada com o nivel de escolaridade dos portugueses, que é muito elevado. Acho que Portugal é um país que está a construir o futuro e não a preservar o passado, ao contrário da Grécia”, destaca. Entre os projetos que gostaria de levar para a frente no US Council of Competitiveness é a criação de uma parceria trilateral entre EUA, Portugal e Brasil. “Estes países deveriam trabalhar juntos porque o oceano Atlântico faz parte da nossa história comum. A história de Portugal é uma das mais importantes do mundo. E o Brasil é uma grande potência, (vai voltar a sê-lo) e faz parte da cultura e diáspora portuguesa, tal como os EUA. Fazemos todos parte deste triângulo altântico, temos muito em comum e seria interessante estabelecer uma discussão entre as três partes sobre competitividade”, conclui. A responsável promete ainda trazer a Portugal, num futuro próximo, um dos encontros da Federação Global de Conselhos para a Competitividade (GFCC), uma das muitas organizações que têm Deborah Wince-Smith aos comandos.