Imóveis de leilões comprados a pronto

12 de abril de 2018 553

Os imóveis a leilão, provenientes de insolvências e penhoras, estão ser comprados a pronto. O negócio continua a atrair muitos portugueses e, quando surgem ativos de valor, também estrangeiros e fundos de investimento. Os objetivos são vários, desde compra para segunda habitação, reabilitação para venda ou arrendamento e turismo. O regresso do investimento ao setor está a inflacionar os preços. Carlos Gomes, presidente da LeiloSoc, revela que os portugueses estão “a aplicar as suas poupanças em ativos imobiliários” e “procuram os leilões públicos para fazer esses investimentos”, numa tentativa de obter maiores rendimentos face aos que hoje os bancos oferecem. “É um processo de equilíbrio. A Banca fica com menos depósitos, mas recupera créditos”, disse.

Armando Oliveira, vice-presidente da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução (OSAE), organismo que gere a plataforma e-leilões, adianta que o número de acessos ao site leva “a crer que se passou do especulador normal para o investidor, pessoas com uma rápida capacidade de endividamento ou fundos próprios”. O e-leilões, a operar desde abril de 2016, tem mais de 11 mil utilizadores ativos e contabiliza 2,8 milhões de páginas consultadas por mês. “Um crescimento magnífico, acima de qualquer expectativa, a plataforma era uma necessidade de mercado”, sublinhou. Segundo Carlos Gomes, a LeiloSoc colocou no ano passado 1200 imóveis no mercado, num valor global próximo dos 20 milhões de euros. A grande fatia (85%) foi comprada por portugueses. Atualmente, as carteiras já não têm ativos tóxicos, contudo 60% respeitam a insolvências de famílias e 40% a empresas. Há poucas semanas, a LeiloSoc promoveu um leilão, cujos ativos tiveram uma valorização de 30%. “As pessoas estão com vontade de comprar, o leilão foi muito procurado”, disse. A leiloeira também realiza vendas a estrangeiros, mas “são leilões de imóveis premium, onde se convida um grupo de investidores a analisar os ativos que, normalmente, são edifícios com desenvolvimento turístico ou comercial que estão em processo de insolvência”. Nesta área, a LeiloSoc trabalha com seis fundos britânicos. Já a e-leilões inseriu no ano passado na plataforma 8911 bens, que registaram 56 573 licitações, resultando em vendas de 482 mil euros. A leiloeira gerida pela OSAE registou 256 pedidos de adjudicação, num valor de 14,8 milhões de euros, que deram lugar a vendas de 22,6 milhões de euros. Para Armando Oliveira, as licitações são feitas “por nacionais”. Como é obrigatório possuir um NIF português, a OSAE desconhece se há estrangeiros envolvidos. Já Lídia Ramos, gestora técnica da Uon-Mediação Imobiliária (que promove leilões presenciais e online) adianta que o boom de ativos a leilão terminou em 2011, mantendo-se no mercado esta solução mas de “forma mais moderada”. A Uon promoveu, no ano passado, cinco leilões de imobiliário e cinco vendas em carta fechada, com um valor global de 17 milhões de euros. Para Luís Lima, presidente da associação de mediação imobiliária APEMIP, “os leilões foram um fenómeno da altura da crise”. O responsável considera que “o perfil do comprador mudou, é alguém que anda à procura de um bom negócio”, mas o mercado de leilões “vale agora um dígito muito pequeno”. 30 famílias por dia entraram em insolvência Os indicadores económicos têm revelado uma recuperação do país, mas esses dados não se estão a refletir nas contas das famílias. No ano passado, foram decretados insolventes 10 803 singulares, ou seja, cerca de 30 famílias por dia. Em 2013, no culminar da crise económica, registaram-se por dia 36 insolvências de famílias, num total de 13 252 processos. Mas nem tudo são más notícias. De facto, o número de insolvências singulares apresentou, no ano passado, uma quebra de 5,8% face a 2016, quando se contabilizaram 11 433 processos. O distrito do Porto continua a apresentar elevadas fragilidades a este nível, sendo a região que no ano passado registou o maior número de insolvências singulares. Foram decretadas falidas mais de nove famílias por dia, ainda assim, houve uma quebra de 6% face a 2016. Lisboa foi o segundo distrito com mais insolvências (1852) em 2017, seguindo-se outros distritos urbanos como Aveiro (943), Setúbal (942) e Braga (674), conforme se constata no “Observatório Infotrust Insolvências – Ano 2017”. O Processo Especial de Revitalização (PER) foi, no ano passado, solução para 644 famílias, número pouco significativo tendo em consideração o universo de insolventes. Mesmo nos anos mais agudos, este instrumento, que permite a empresas e singulares em situação económica difícil e em insolvência iminente estabelecer negociações com os seus credores, caso reúnam condições de recuperação, registou pouca procura. A demanda mais intensa foi em 2015, quando recorreram 999 singulares. Em 2016, o PER permitiu salvar da insolvência 817 famílias. Este contexto de fraca recuperação económica das famílias soma-se a um aumento dos créditos à habitação e ao consumo. Os empréstimos para compra de casa somaram, no ano passado, 8259 milhões de euros, um crescimento de 327% em relação em 2012, quando bateu em mínimos. No mesmo período, o crédito ao consumo subiu 110%, diz o Gabinete de Estratégia e Estudos, do Ministério da Economia. O Banco de Portugal tem demonstrado preocupação com estes indicadores, que podem voltar a comprometer a banca e aumentar o malparado. O supervisor já recomendou aos bancos limites na concessão de crédito. A Banca fechou 2017 com 37 mil milhões de euros de malparado. Empresas no bom caminho A realidade dos números indica uma clara recuperação das empresas face aos anos mais espinhosos da crise económica. Em 2017, registaram-se 2716 insolvências de empresas, o que perfaz uma média de sete por dia. No auge da recessão, contabilizavam-se diariamente 15 empresas sem meios para cumprir com as suas obrigações, mais do dobro que atualmente. E a tendência é de desaceleração. No ano passado, verificou-se uma descida de 23,2% no número de insolvências de empresas, conforme se constata no “Observatório Infotrust Insolvências – Ano 2017”. Indústrias transformadoras, retalhistas e serviços foram, no ano passado, os setores mais penalizados. Lisboa liderou o número de insolvências e empresas, com 673 notificações. Vistos gold à medida dos investidores chineses “Os vistos gold eram o fato à medida dos investidores chineses”, diz o presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP), Luís Lima. Na verdade, desde a entrada em vigor da Autorização de Residência para a Atividade de Investimento (ARI) que os cidadãos chineses lideram a tabela de atribuições. E a principal aquisição são imóveis de valor igual ou superior a 500 mil euros. Apesar do abrandamento nas compras de imóveis via ARI, muito devido às suspeitas de favorecimento em alguns processos de atribuição de vistos, que decorrem ainda em tribunal, Luís Lima demonstra forte confiança no mercado imobiliário português e na sua capacidade de atrair investimento estrangeiro. Segundo avança, os franceses são hoje em dia os principais compradores de residências, seja para viver seja para afetar ao turismo. Os ingleses, apesar do Brexit, não abandonaram o país e continuam a comprar imóveis, essencialmente no Algarve. Luís Lima diz que agora se nota muito a presença de brasileiros, que estão a centrar as suas aquisições na região do Grande Porto. “A incerteza que alguns países vivem, acaba por nos trazer benefícios”, advoga. Desde outubro de 2012 (arranque dos vistos gold) até ao fim de março, foram investidos 3,4 mil milhões de euros em aquisição de imóveis. A grande fatia foi em residências de valor igual ou superior a 500 mil euros, o que permitiu a emissão de 5579 autorizações de residência. Os projetos de reabilitação geraram 137 vistos gold. A China é de longe o principal investidor. O investimento total ao abrigo dos vistos gold foi de 3,7 mil milhões.