'Já perdoei. Foi uma fatalidade', diz pai de menino morto por atirador

21 de outubro de 2017 914

Aos 13 anos, João Pedro Calembo era bom aluno, atuante na igreja, carinhoso com os irmãos mais novos e queria ser engenheiro civil. Era aluno do Colégio Goyases há cerca de cinco anos e se preparava para concluir os estudos no Colégio Militar.

 

Quando não estava na igreja ou na escola, estava jogando futebol ou videogame. Ele foi a primeira vítima do atirador de 14 anos que, no final da manhã de sexta-feira (20) matou dois colegas e feriu outros quatro.

"João Pedro é mesmo cristão. Um dia chegou até mim e disse 'pai, tenho um colega que sofre muito preconceito. Eu disse 'meu filho, você tem que orar por ele'. Sempre ensinei a respeitar o próximo", diz o publicitário Leonardo Calembo, 41, pai de João Pedro e dos dois irmãos dele, meninos de 6 e 8 anos.

João Pedro sentava na carteira imediatamente atrás da do atirador, no fundo da classe. Foi o primeiro a ser morto. O pai da vítima nega a versão que o atirador e colegas de turma contaram à polícia, de que João Pedro seria desafeto do menino que efetuou ao menos 11 disparos contra os colegas de classe.

Para os investigadores, o menino premeditou o crime por causa do bullying que sofria na escola. Colegas de escola disseram que o atirador era chamado de "fedorento" e relataram que o atirador chegou a receber um desodorante como provocação.

A polícia informou que o atirador disse em depoimento que se inspirou em duas outras tragédias envolvendo atiradores em escolas -o massacre de Columbine, em 1999, nos EUA, e o de Realengo, em 2011, no Rio.

"Não acredito nessa história de desodorante. Não existe essa história de desafeto. Bullying hoje é o nome novo a uma brincadeira que se faz há tantos anos", diz o pai, presbítero da Igreja Batista Renascer, frequentada por João Pedro.

Para Leonardo, existe hoje uma "sociedade de filhos órfãos de pais vivos". A arma utilizada no crime, uma pistola .40 da Polícia Militar, era usada pela mãe do menino, sargento da PM. O pai dele é major da instituição.

"Os pais hoje não conhecem seus filhos. Acredito que foi o caso. Os pais não tinham real ideia de que o filho precisava de ajuda", afirma o pai do menino morto, que diz ter perdoado o atirador. "Eu já perdoei desde o início. Foi uma fatalidade."

João Pedro morava com a família perto da escola. O pai estava em casa no momento da tragédia e estranhou a movimentação de helicóptero no local. "Minha esposa recebeu uma ligação da mãe de outro aluno. Até então, não sabíamos o que tinha ocorrido. Entrei na escola, mas não deixaram ir até a sala de aula. Quando pisei dentro da escola, me falaram que ele tinha falecido", relembra o pai de João Pedro.

O avô paterno do menino, Ronaldo Calembo, 70, se assustou quando uma vizinha falou que havia ocorrido um tiroteio na escola do neto dele e ele não conseguiu falar com seu filho. "Minha nora disse 'meu sogro, venha para cá urgente'. Pensei: aconteceu com meu neto", relembra Ronaldo.

O avô descreve João Pedro como bom neto. "Educado, nasceu dentro da igreja." Para ele, a escola poderia ter identificado antes alterações no comportamento do atirador. "Meu neto do meio dizia que o menino [o atirador] empurrava ele. Talvez tenha faltado um acompanhamento melhor da escola", diz o avô.

João Pedro está sendo velado no cemitério Parque Memorial de Goiânia desde a madrugada deste sábado (21). O enterro deve acontecer no final da manhã. A mãe do menino, Bárbara, é consolada por parentes e amigos ao lado do caixão onde está João Pedro, com uma miniatura de fusca preto, paixão dele e do pai.