Miguel Díaz Canel: “o Partido Comunista de Cuba garante a unidade da nação e do seu povo”

20 de abril de 2018 424

Como um astro da NBA, Miguel Díaz Canel chegou à Assembléia Nacional do Poder Popular fazendo a saudação dos jogadores de basquete. Tocou com a palma da mão direita cada um dos membros do Conselho de Estado que governará Cuba nos próximos cinco anos. Estava no seu grande dia, talvez o mais importante de sua vida e na véspera de completar 57 anos. Se a história absolveu Fidel Castro depois de dizer sua famosa frase após o assalto ao quartel Moncada, em 1953, do novo presidente da ilha dirá que foi a ponte entre os revolucionários de 59 e a nova geração de políticos que se somam ao governo.

“Cuba espera que sejamos como eles, capazes de lutar vitoriosamente todas as batalhas que nos aguardam. A presença de Raúl, Machado, Ramiro, Guillermo e outros revolucionários, nos dá a oportunidade de abraçá-los e de abraçar a história viva”, disse logo que começou a falar aos 604 deputados presentes no Palácio das Convenções. Sério, ereto, erguia o olhar seguidamente, fazendo uma pausa entre os parágrafos do discurso que durou apenas meia hora. Raúl Castro, comandante de Sierra Maestra, primeiro-secretário do Partido Comunista de Cuba, Ministro das Forças Armadas por quase quatro décadas e chefe de Estado que substituiu Fidel quando ele se aposentou do poder falou em seguida para a Assembleia, presidida por Leonardo Lazo.

“Não estamos inaugurando mais uma legislatura”, disse Díaz Canel na abertura de seu discurso. Não parecia tenso, mas o meio sorriso denotava a pressão do momento. Era clara a envergadura do ato que o tinha como protagonista central e possível perceber a emoção contida do novo presidente. Uma das secretárias do Parlamento convocou-o dizendo “colega deputado, o senhor é o novo presidente do Conselho de Estado e de Ministros da República de Cuba”. Minutos antes, havia sido lido o resultado da votação. O engenheiro eletrônico que conduzirá os destinos da ilha pelos próximos cinco anos foi escolhido por 603 dos 604 legisladores presentes. Na maior das Antilhas, o voto é indireto e os deputados que o ungiram chegaram a seus postos nas eleições de março passado.

Ao contrário do Brasil, onde chegam ao Congresso senadores ou deputados tão famosos como desacreditados ou acusados pela Lava Jato, em Cuba a maior parte são trabalhadores anônimos, profissionais, educadores, integrantes da União de Juventudes Comunistas (UJC), artistas ou desportistas. Entre eles aparece a educadora com mestrado em sexualidade, Mariela Castro Espín, filha de Raúl e prestigiada especialista no assunto. Ou o presidente do Instituto Nacional do Esporte (INDER), Antonio Becali Garrido. Além deles, o jornalista Antonio Hernández Mena, que atua na própria Assembleia e a taekwondista Glenhis Hernández Horta, campeã panamericana e integrante da equipe olímpica nos Jogos de Londres 2012. Nenhum candidato faz campanha fora dos seus municípios de origem. Não aparecem em publicidade eleitoral e muito menos recebem fundos partidários para chegar ao Parlamento.

Díaz Canel, vestido com um impecável terno cinza, com o distintivo da bandeira cubana na lapela esquerda, fez vários elogios ao seu antecessor: “Raúl, como é carinhosamente chamado pelo nosso povo, é o melhor discípulo de Fidel. Assumiu a liderança da Revolução em uma difícil situação econômica e soube superar a dor pessoal, por dever “.

Castro e o estreante presidente cubano entraram quase formando um par no recinto onde ocorreu a transferência de comando e receberam os primeiros aplausos do dia. O comandante de 86 anos parou e sorriu ao seu sucessor, talvez procurando quebrar a solenidade do momento. Depois vieram os discursos de reafirmação do socialismo e os relatórios genéricos – especialmente de Raúl – sobre a situação atual em Cuba, sem perder de vista o passado revolucionário.

Em um dos momentos de maior compromisso político do seu discurso, o novo presidente disse: “Para nós, é absolutamente claro que apenas o Partido Comunista de Cuba garante a unidade da nação e do seu povo.” Também referiu-se ao fato de que a Revolução cubana não havia terminado com seus guerrilheiros. “Segue de verde oliva para vencer em todos os combates”, comentou. Mas enfatizou a necessidade de “corrigir nossos erros, indisciplinas e problemas”. A autocrítica do novo presidente coincidiu com a do comandante Castro. “Sabemos muito sobre pedir e muito pouco sobre racionalizar”, criticou o primeiro secretário do Comitê Central de PC. Fez isso para descrever como, em uma ocasião, milhares de litros de combustível foram usados “sem autorização e por engano”. “Terão que devolvê-los”, sugeriu com firmeza.

Estados Unidos foi outro tema central em ambos os discursos. O ex-chefe de Estado declarou: “Não precisamos receber lições de ninguém, muito menos dos Estados Unidos”. Referiu-se a Donald Trump sem citá-lo como “o vizinho que temos …”. Ao final, surpreendeu brincando com os deputados, depois de falar em tom pausado e, às vezes, improvisar. Para fechar, pegou as páginas do discurso e disse: “Bah, terminei!” Aplausos prolongados vieram da plateia. Díaz Canel o escutava da sua cadeira, transformado no novo presidente. O homem que um dia surgiu como liderança da juventude em sua terra natal, Santa Clara, para assumir o poder em Havana. A cidade que um grupo de guerrilheiros barbudos libertou há quase 60 anos, quando ainda não havia nascido.

TraduçãoDaniela Sallet

 

 

(Foto: Irene Pérez/ Cubadebate)