O IMPOSTO, UM GRANDE IMPOSTOR!

17 de julho de 2024 41

Desculpem o trocadilho fácil do título deste artigo, mas não consegui me livrar da tentação de fazê-lo. É que, desde logo, quis afirmar a falácia da cobrança de impostos como forma de proporcionar ao Estado os meios de proteção ao cidadão.  

Na relação social mercantil, própria ao sistema produtor de mercadorias, juntamente como a extração de mais-valia e a inflação de preços das mercadorias que causa a perda de poder aquisitivo dos salários, os impostos se configuram como outra grande forma de exploração social.   

O imposto é uma mensuração em valor econômico, portanto sob a forma da mercadoria dinheiro, cobrado aos consumidores de mercadorias; em parte dos lucros obtidos empresarialmente pela produção e venda de mercadorias que são repassados aos consumidores; ou nas operações financeiras, para a sustentação da máquina estatal, predominantemente opressora.  

Por mais que se queira dourar a pílula, como querem todos os governantes, os impostos são cobranças impostas ao povo sob a forma-valor representada pelo padrão monetário estatal, o dinheiro, e como categoria capitalista sui generis, imprescindível e imanente à opressão estatal do capital como forma jurídica circunscrita à regência social da forma-mercadoria, fonte de todos os males. 

O tributo, ou imposto, palavra que se origina do latim tributum, nasceu inicialmente sob a forma de contribuição material - alimentos, animais, peles, etc. - dos produtores das tribos para a sustentação administrativa comunitária solidária, sem a característica posterior de quantificação monetária impositiva, o que demonstra que pode existir participação comunitária na sustentação material da sua organização jurídico-constitucional horizontal e fora do sistema produtor de mercadorias e da forma-valor.  

À altura correspondia a uma doação espontânea, fruto de uma necessidade de suprimento material para aqueles que se incumbissem da organização comunitária, contribuição que, infelizmente, com o passar do tempo adquiriu uma conotação opressora.     

A sua consolidação como tributo oficial, estatal, veio com a escravização e a consequente necessidade de formação de forças militares garantidoras do regime escravista, principalmente sob a forma de salário em dinheiro, de onde se pode concluir a negatividade intrínseca a essa categoria social que mais tarde se configuraria como uma das mais importantes categorias capitalistas da chamada modernidade.  

Há hoje um descompasso entre duas contas mercantis fiscais estatais: 

-  a necessidade de suprimento financeiro dos seus custos operacionais estatais, que incluem gastos com a infraestrutura de produção capitalista (estradas, energia, portos, etc.); gastos com os juros da dívida pública crescente; subsídios de financiamento à produção com juros baixos pelos chamados Bancos de Desenvolvimentos; instituições do poder político (parlamento e justiça); máquina administrativa (salários do poder executivo); juros da dívida pública; e gastos miliares (tropa, equipamentos e manutenção) e; 

a capacidade de arrecadação de impostos numa economia mundialmente depressiva, que está levando a máquina estatal a um endividamento insuportável graças aos juros pagos aos bancos, grandes e pequenos rentistas e aos grandes capitalistas industriais e comerciais que hoje vivem mais das aplicações financeiras do que da produção e venda de mercadorias. 

Neste cenário, a direita, sabedora do colapso iminente das contas públicas e da consequente falência do sistema de crédito bancário, defende o estado mínimo, sem preocupações sociais, e pronto a fazer, pela força das armas, o ajuste das contas públicas a qualquer preço, inclusive com o aumento dos impostos cobrados à população na compra e venda de mercadorias.  

Mas a esquerda institucional, com argumentos diferenciados, e com preocupações sociais eleitorais, converge com a direita no item relativo à cobrança dos impostos. 

 A esquerda mais combativa, a intelectualidade fora da institucionalidade e alguns tímidos setores da esquerda institucional defendem a taxação das grandes fortunas como se fosse a pedra fundamental para a solução da crise do capital. Incorrem no erro de querer consertar o capitalismo a partir de suas próprias categorias, sem superá-las.

É necessário entender que as grandes fortunas estão na propriedade das pessoas jurídicas e apenas uma menor parte delas na propriedade das pessoas físicas. As empresas precisam permanentemente de mais capital para fazer face à corrida concorrencial de mercado cujo capital é cada vez mais monopolista e concentrado nesses monopólios.  

Taxar os seus patrimônios financeiros e lucros das empresas, aliviaria a falência estatal e, consequentemente as finanças públicas, mas causaria uma depressão econômica ainda maior do que a atual por conta da redução da capacidade empresarial de investimento, ou seja, sob a lógica do capital na fase do seu limite interno e externo de expansão, não há soluções simples e viáveis.  

Os efeitos colaterais aparecem como num lençol curto na tentativa de cobrir um corpo agigantado e descoberto. 

Ademais, há uma predominância de parlamentares conservadores nas casas legislativas mundo afora, como resultante do jogo democrático burguês onde impera o poder econômico eleitoral, e a taxação das grandes fortunas empresariais seria matéria controversa por conta de que tal medida aumentaria o desemprego estrutural que já é crescente por conta mecanização eletrônica irrefreável na produção de mercadorias, pois o capitalismo cava a sua própria sepultura, conforme já expressava Marx.         

Essa unidade de comportamento de aumento tributário da direita e da esquerda, mesmo que sob intenções diferenciadas, decorre do fato de que ambas dirigem as suas diretrizes políticas sob uma mesma base mercantil.   

A direita age assim por razões obvias, ou seja, para tentar dar sequência ao seu objeto teleológico de crescimento do bolo para que dele possa jogar ao chão para o povo as migalhas que sobrarem dos seus banquetes, mas sem querer compreender que a festa acabou, tal qual o baile da Ilha Fiscal no crepúsculo da monarquia brasileira em transição para a república. 

A esquerda institucional, estatizante, quer colocar o capital a serviço da política, sem compreender que a política, na sociedade do capital, extrai recursos das relações mercantis e é a ela submissa, razão pela qual fala permanentemente na retomada do desenvolvimento econômico para equalizar as contas públicas e tentar aumentar e melhorar o nível de empregabilidade, ou seja, tentar aumentar a quantidade de gente na exploração pelo trabalho abstrato que defendem equivocadamente.  

Lula, há pouco tempo, fez um discurso contra a liberação de cobrança de impostos aos empresários sob a forma de subsídios, mas misturou coisas diferentes como se fossem idênticas para defender o aumento indiscriminado da arrecadação de impostos.  

Isentar imposto sobre mercadorias de consumo popular é medida que beneficia o povo que as compra; desonerar a folha de pagamento, algo feito pela presidente Dilma Rousseff em 2012, na contribuição previdenciária de responsabilidade empresarial em 20% e substituí-la por uma taxa de imposto menor sobre a renda bruta é agradar o capital sem benefício direto para as contas da previdência social - que ele quis equalizar tirando direitos dos aposentados, razão da dissidência que criou o Psol, ainda em 2003, agora aliado político no cínico jogo eleitoral. 

Javier Milei, por sua vez, afirma que o ajuste das contas públicas dar-se-á sobre o corte de gastos com demandas sociais, não com o setor capitalista privado que, claro, quer revitalizar diante do marasmo atual.  

Não tenhamos dúvidas: as categorias capitalistas valor, trabalho abstratodinheiromercadoriamercadoEstadopolítica institucionalpartidos políticos, e essa que tratamos neste artigo, o imposto, formatam o universo de uma relação social que entrou em disfunção orgânica por seus próprios fundamentos ao atingir o limite interno e externo das suas existências expansionistas.  

Precisamos ter a coragem de nos desprendermos delas e estabelecermos uma nova forma de relação social que nos humanize e que negue todas as categorias que são imanentes à destrutiva e, agora, autodestrutiva relação social capitalista. (por Dalton Rosado)

Fonte: CELSO LUNGARETTI
A VISÃO DEMOCRÁTICA (POR CELSO LUNGARETTI )