Uma ode à sabedoria popular

1 de março de 2018 773

Resguardar e empoderar a mulher kalunga, sua cul­tura, tradições e, princi­palmente, sua sabedoria ances­tral é a preocupação central do projeto Mulheres em Círculo- “Sabedoria da mulher Kalunga, evento que acontece de ama­nhã até o próximo domingo e chega a três regiões da Chapada dos Veadeiros: amanhã estará na Comunidade de Diadema, no dia 3 (sábado) em Cavalcan­te, na Casa Kalunga, e domingo (4) encerra-se na comunidade Engenho.

À frente deste projeto está a psicóloga Marnene Souza, coor­denadora de Mulheres em Círcu­lo, um projeto que foi ensaiado em diversas situações, em vivên­cias, workshops e até na clínica da idealizadora. Mas foi apenas com o apoio da Lei Estadual de Incentivo à Cultura que a ação ganhou sustentabilidade para começar a chegar onde queria.

“O projeto traz consigo a va­lorização das ricas tradições des­tes lugares. E nas edições futuras queremos ampliar ainda mais o projeto, com a realização das ati­vidades em outras comunidades da Chapada dos Veadeiros. Des­ta vez, por questões de logística e acessibilidade, estamos realizan­do apenas em três localidades”, ex­plica a psicóloga.

O mergulho à cultura kalunga é a continuidade de algo maior. Com o nome Mulheres em Círcu­lo – Sabores e Saberes do Femini­no Sagrado, a proposta iniciou-se aqui em Goiânia, domingo (25). Na ocasião contou com a presen­ça da artista plástica Rosy Car­doso, que trouxe questões sobre a arte no feminino, e da dança­rina Mara Natércia, que liderou uma dança de roda e música. Em Goiânia, o projeto será realizado ainda no dia 23 de março.

CHAMADO DO CORAÇÃO

O desenvolvimento deste pro­jeto, bem como a “tour” pelas co­munidades da Chapada dos Vea­deiros, segundo Marnene Sousa, era mais do que um sonho: ela o define como um “chamado do co­ração”. “Mulheres em Círculo tam­bém foi incentivado por meu in­teresse na ecopsicologia, a união entre psicologia e a ecologia, tan­to como ciência quanto movimen­to social, que busca o elo humano com a rede da vida, a natureza.” “A ecopsicologia busca fazer com que o ser humano entenda que faz parte da natureza e não é superior a ela”, explica.

Como boa estudiosa da ecopsi­cologia, Marnene Souza, que ain­da trabalha na ONG Amazonas Visão (cuja proposta é promover ações na área da saúde e do meio ambiente à comunidade ribeiri­nha do Rio Araguaia e Rio Ama­zonas), notou grande respeito e in­teração com o meio ambiente nas tradições e cultura das comunida­des Quilombolas.

“Escolhemos trabalhar nesta região de Cavalcante, por tratar­-se da porta de entrada para a co­munidade Kalunga e por se tra­tar de um local, apesar de muito sofrido, é muito fértil em saberes. Com parteiras, curandeiras, co­zinheiras, com uma saber mui­to interessante. Em Mulheres em Círculo queremos dialogar com mulheres mais jovens, para nun­ca se esqueçam da sabedoria que mora nas mulheres mais velhas da comunidade”, explica Marnene.

A troca de saberes é um objeti­vo claro da iniciativa que pode ser notada na equipe do projeto, que além da psicóloga de duas mulhe­res Kalunga, as irmãs Milza e Mar­ta Farias. “Estas duas são mulhe­res incríveis, que fico emocionada só de falar. Milza é uma enfermei­ra que nunca perdeu o contato com suas origens e vai falar sobre a cultura Kalunga. Já Marta tem a sussa (uma dança tradicional nos Quilombos de Goiás) no pé e vai mostrar ainda o poder da culiná­ria Kalunga, em um grande resga­te de cores e sabores”, conta a coor­denadora.

Neste clima de integração a dançarina Cláudia Prado vai mos­trar às comunidades o poder das danças ancestrais com cirandas de roda, danças sagradas circula­res. Rosy Cardoso, que já realizou exposições, como “Mulheres Que Amam Demais” e “Lata D’Água na Cabeça”, com temas ligadas ao em­poderamento das mulheres, vai compartilhar com o projeto seus conhecimentos da arte no femini­no e pinturas de mandalas.

MULHERES EMPODERADAS

Estará ainda presente em Mulheres Em Círculo músicas, cantorias tradicionais, contos, mitos, celebrações, medita­ção, entre outras ferramentas. E não será necessário que as participantes possuam conhe­cimentos nem habilidades es­pecíficas para se juntar ao pro­jeto, que gira em torno de um bem maior: uma verdadeira igualdade entre sexos.

“Queremos despertar uma nova consciência. Integrar o masculino e o feminino em uma sociedade até hoje muito patriarcal. A gente ainda sus­tenta muitos valores do uni­verso masculino, o que cau­sa um desequilíbrio do yin e yang , que precisam trabalhar juntos.

OS KALUNGA

Cavalcante, que conta com belas atrações naturais, como diversas cachoeira, a pequena cidade é berço dos Kalunga–a maior comuni­dade de remanescentes qui­lombolas do Brasil. Estra é uma comunidade que cons­truiu a sua cultura ao longo de quase 300 anos de isola­mento (que foi uma maneira do povo Kalunga de encon­trar a liberdade). Até 1982 não havia um levantamen­to sobre sua sociedade – que só teve seu valor reconhe­cido pela antropóloga Mari Baiocchi.

A coordenadora do projeto Marnene Souza conta que o projeto tem
o objetivo de trazer empoderamento às mulheres das comunidades(FOTO CRISTÓVÃO MATOS)

Projeto terá muita música, celebração e, claro, sussa

Os Kalunga