União entre Estado, Ministério Público e Judiciário faz de Rondônia ilha de resistência e avanços em área esfacelada Brasil afora: a Saúde Pública
Secretário de Saúde tem MP/RO como aliado
Texto, edição, entrevistas e reportagem: Vinicius Canova
Sonoras e fotografias: Gregory Rodriguez
Porto Velho, RO – “Nós trabalhamos lado a lado, harmonicamente. O Ministério Público (MP/RO) não ajuíza ações contra nós”, declara de forma cristalina – e exagerada – o Secretário de Estado da Saúde de Rondônia (SESAU/RO) Williames Pimentel, que integra o governo Confúcio Moura (PMDB) desde novembro de 2012.
A fala demonstra, a princípio, que os tempos de beligerância entre o Estado e a instituição fiscalizadora da lei – pelo menos no que diz respeito ao setor – ficaram para trás, dando vazão a novos ares aglutinadores e de resultados práticos.
A realidade é confirmada não apenas pela gestão peemedebista através dos dizeres de Pimentel, mas também pela promotora de Justiça Rosângela Marsaro Protti, diretora do Centro de Apoio Operacional da Saúde (CAOP-SAÚDE), e, mais ainda, respaldada e arrematada pela juíza de Direito Inês Moreira da Costa, da 1ª Vara da Fazenda Pública de Porto Velho, autoridades ouvidas e questionadas pelo jornal eletrônico Rondônia Dinâmica.
Um exemplo claro dos avanços é o fato de Rondônia figurar como único Estado da federação a registrar crescimento na oferta de leitos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em todo o País, 32% a mais entre 2008 e 2016, totalizando 853 novas vagas. O mesmo levantamento também demonstra destaque na oferta e ampliação de vagas em Unidades de Terapias Intensivas (UTIs). No total, a rede estadual tem 174 leitos de UTI – todos de alta complexidade – número que coloca o Estado acima da média nacional.
“O poder público tem de atender a quem mais precisa, evitando dor, sofrimento e até mesmo a morte”, declara
Pelos critérios do Ministério da Saúde (MS), considerando a população, seriam necessários 15 leitos de UTI.
“O Estado tem 24 a mais, uma marca extraordinária, levando em conta o caos vivido pela maioria dos estados”, comemorou a Administração Pública à ocasião da publicação.
Rondônia também é apresentada como a 12ª unidade da federação entre as que mais investem na saúde pública.
Os dados foram expostos no final de março deste ano pelo próprio MS. A evolução ocorria enquanto, paralelamente, o País fechava 27.691 leitos no decorrer dos mesmos oito anos, situação descrita minuciosamente pelo noticiário nacional patenteado pelaGloboNews. “Deixamos no passado a caracterização pejorativa de hospital de guerra para nos tornarmos referência em tratamento de câncer – com duas cidades-polo: Porto Velho e Cacoal”, celebra.
O júbilo do secretário vai além, pois o Estado desponta, ainda, em setores como: ascensão em vídeo-cirurgias ortopédicas, captação e transplante de órgãos, Centro de Diagnóstico por Imagens, cirurgias bariátricas sem contar, também, o “moderno Laboratório Estadual de Patologia e Análises Clínicas (Lepac), com capacidade para realizar até três mil exames de alta complexidade por hora”, acentua o titular.
O otimismo voltado à ala essencial do serviço público vai da euforia desenfreada do secretário de Saúde, e é natural que advogue em causa própria sem esconder o ânimo ao apontar os avanços de sua pasta, ao entusiasmo contido da promotora Rosângela Marsaro que, conquanto não tão radiante quanto o primeiro, assevera: “tenho muito cuidado em dizer que não vai bem”, responde sobre se há ou não precariedade quando o tema é a prestação dos serviços.
“30% dos atendimentos no João Paulo II deveriam ser resolvidos pelas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs)”, assevera a promotora Rosângela Marsaro
Entretanto, diferentemente da colocação genérica do gestor estadual, aponta que, em alguns casos, ainda é necessária a intervenção ministerial ajuizando ações quando as tratativas extrajudiciais não restam frutíferas, não obstante a incidência seja cada vez menor:
“Aqui em Rondônia nós conseguimos alguns êxitos em parceria com o Estado no âmbito extrajudicial. Em algumas coisas, infelizmente, não. Aí temos de ajuizar a ação”, disse.
Judicialização da Saúde: por que as pessoas recorrem à Justiça?
Segundo o MP/RO, a área com maiores números de atendimentos patrocinados pelo órgão é justamente a da Saúde. Para se ter ideia, de 2013 a 2017, somente na Comarca de Porto Velho, a Promotoria de Saúde realizou 2.460 assistências, informação repassada oficialmente à redação pela instituição no dia 21 de setembro.
“Como aquele Hospital salva vidas, gente! Salva vidas de pessoas que não podem pagar”, relata sobre o JP II
A magistrada Inês Moreira explica por quê. Na sua visão, quando se fala em judicialização da Saúde há duas questões fundamentais envolvidas: a primeira refere-se ao planejamento das políticas públicas, que, dentro das previsões orçamentárias, confere ao gestor a escolha do melhor resultado para a população; do outro lado, está o Poder Judiciário, com a missão de garantir os direitos fundamentais – especialmente o direito à vida e à dignidade humana.
Ainda de acordo com a juíza, a Constituição Federal (CF/88) trata do direito à saúde, prevendo, dentre outras coisas, o acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação, ou seja, incumbe ao SUS a abrangência aos mais variados tratamentos compelindo-o à obrigatoriedade de ser disponível a todos, igualmente.
“As demandas que chegam ao Judiciário no que diz respeito à falta de medicamentos já padronizados pelo SUS são mais fáceis de avaliar, porque, nestes casos, o ente púbico já é obrigado a fornecê-los, competindo ao juiz, então, avaliar o motivo do descumprimento e determinar que haja o fornecimento”, pontua.
No entanto, inúmeros reclames que chegam à Justiça fogem à regra da padronização, resumidamente, pedidos de medicamentos e tratamentos não fornecidos pelo SUS.
“Há também casos em que os medicamentos ou os tratamentos existem, mas não para a doença objeto de análise judicial. Esses casos exigem avaliação mais cuidadosa por parte do juiz porque este, além de não ser técnico na área impossibilitando aferir qual o melhor medicamento/tratamento, deve se valer de peritos para chegar à conclusão da questão”, complementa.
Neste caso, os cuidados precisam ser redobrados porque, ao deferir o pedido, pode haver interferência nas políticas públicas estabelecidas para determinado tratamento, pois, se concedido para um paciente ou outro, deverá ser estendido aos demais, levando em conta o princípio da igualdade.
Entrevista: Rosângela Marsaro, promotora de Justiça
Protetor solar: caso de Justiça e Saúde Pública
Solicitações como as retratadas em ações promovidas para custeio de protetor solar por pessoas economicamente prósperas, por exemplo, ilustram que os gestores não são responsáveis exclusivos pelos flagelos no Sistema.
“Já houve pedidos de protetor solar aqui, de coisas absurdas! A gente vê que é alguém com recursos, às vezes até da área da Saúde. Aí vai, consulta lá 'fora' e vem aqui pedir tratamento de graça mesmo podendo pagar. Embora o SUS seja universal, igual para todo mundo, não há recursos para atender a todas os pleitos. Precisamos eleger prioridades, por isso o SUS faz a lista de medicamentos e padroniza tratamentos”, diz.
Inês Moreira tem 21 anos de magistratura e atua na Fazenda Pública no mínimo há uma década. Ela não titubeia ao garantir, em relação à Saúde Pública, que “com certeza melhorou muito. E isso a gente tem acompanhado há algum tempo”.
“Esse acompanhamento é feito, inclusive, através do Comitê Estadual de Saúde formado por juízes, gestores e outros envolvidos. Agora existe uma integração de trabalho onde há promoção de discussões sobre o que precisa melhorar. Felizmente, muita coisa melhorou. Não está cem por cento, mas melhorou bastante, principalmente no Estado”, anota.
O Comitê Estadual de Saúde foi criado pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS), instância máxima de deliberação do SUS de caráter permanente, formalizado com a missão de deliberar, fiscalizar, acompanhar e monitorar as políticas públicas de sua alçada.
Entrevista: Williames Pimentel, secretário de Estado da Saúde
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POR: VINICIUS CANOVA