VIVÊNCIAS DA PELE E DO CORAÇÃO

27 de novembro de 2017 749

Ah, vivências da pele e do coração! Quantas acrescentam e quantas despedaçam! O fato se deu em um lugar distante, à beira da praia.
A menina cresceu, um pouco ou muito não saberia dizer, em pedaços. Ora com a mãe, ora com o pai, ora com a rua. A rua no sentido de desvendá-la até altas horas da noite sem limite algum. 
Foi na escuridão que o homem, de idade bem acima do que a dela, pensou em gandaia. Veio o carro, a barraca de pastel, o retorno e a “vitória” dele sobre seu corpo de menina de cabelos loiros com tranças e fitas. De início, imaginou-se adulta, mas quando sentiu a respiração ofegante dele, sem ternura alguma, pediu que parasse. Tudo em vão. Não cessou. Tinha-a como sua caça naquele dia.
A mãe, que ignorava os percursos da filha até a noite alta, tomou providência ao ser chamada pelo dono da farmácia, que ouvira, de uma amiga da menina, o relato de susto, incerteza, confusão interior... 
A pele do homem roçou com impacto na pele da garota e ela, até hoje, tem dúvida de quem foi a culpa.  Nem pensa na falta de proteção que a fez vítima.
O processo continua em segunda instância. Pelos depoimentos, existe a incerteza se, pelo seu desenvolvimento físico, o indivíduo poderia tê-la confundido com uma adolescente acima de 14 anos e aceitar o pastel seria sinal de conivência com os desejos dele. 
Estou convencida de que ela não perseguia sensações de epiderme, mas aconchego; buscava meiguice para seu coração com hematomas.
E para fazê-la crer que não é somente carne recoberta por pele? E para fazê-la crer que a sua função no mundo não é estar à disposição de quem deseja seu corpo? E para acreditar que é possível, mesmo com o corpo rompido, construir uma história do amor?
Pelo que soube, desconheço a veracidade, a mãe da menina não se encontra confiante na culpa do predador, com quem tem “criado laços”. 
Coisas da pele para quem não tem coração. Coisas do coração para quem sonhava ir além da pele.

 

 

 

 

MARIA CRISTINA CASTILHO DE ANDRADE -

 Professora e cronista. Coordenadora diocesana da Pastoral da Mulher – Santa Maria Madalena/ Magdala. Jundiaí, Brasil.