A CRISE DO CAPITALISMO E O PARTO DE UM NOVO MUNDO

26 de julho de 2024 44

 

Na medicina, a crise representa o momento crítico entre a cura e a morte. Quando dizemos algo como o parto do novo, buscamos fazer uso de uma uma metáfora usando elementos da medicina  para dizer que algo novo está para nascer sob o quadro de crise terminal do modelo da relação social forma-valor, que vem mostrando amplamente a sua inconsistência e obsolescência.  

A crise atual pode vir a ser condição de cura ou de morte.  

A cura pode ser representada por um novo modo de relação social que use todo o saber adquirido pela humanidade em prol de uma produção e de uma organização sociais que demonstre um novo grau de racionalidade humana.  

A morte pode ser representada por uma hecatombe nuclear que vem sendo anunciada e/ou pelo aquecimento global provocado pelo próprio  ser humano preso à autofagia de uma relação social segregacionista e subtrativa da produção social coletiva pelo comando abstrato, irracional, predatório e ditatorial da forma-valor. 

Alguém que tem esperança vê as luzes das estrelas que estão distantes em meio à mais intensa escuridão da noite; alguém que se desespera reage de formas aparentemente distintas, mas igualmente inconsistentes, que  se configuram no apego ao insuportável ou numa volta ao outrora suportado, mas irrealizável no presente.  

São três posições distintas: (i) a dos querem avançar sob novos conceitos; (ii) a dos que querem consertar o inconsertável; e (iii) os que querem o retrocesso.  

Vivemos um momento ímpar no itinerário da nossa história porque junta-se a crise econômica com a crise de seu modelo político-institucional serviçal - numa relação de causa e efeito -, fato que causa perplexidade justamente porque precisamos superar esses dois negativos conteúdos sociais concomitantemente.  

Não dá para se superar um sem se superar o outro, bem como não há como reformá-los convenientemente sob um mesmo critério de base de relação social. Ou se superam os dois ou corremos o risco de sucumbirmos como espécie.  

Se quisermos classificar as correntes de pensamento na atualidade elas seriam: os conservadores, os social-democratas e os emancipacionistas. 

Os conservadores de direita acreditam, equivocadamente, que todos os problemas sociais se resolvem com uma disciplina férrea e trabalho duro, combinado, evidentemente, com uma agenda de costumes retrógrada que consideram como padrão moral contributivo.   

Para estes, a forma-valor é algo tão natural como comer e beber e por ignorância científica ou interesse de manutenção de relações humanas subalternas e escravistas - este último aspecto na maioria das vezes predominante - diante do avanço de proposições humanistas que calam fundo na evolução das consciências humanas, não hesitam no apego ao estado jurídico-político-ditatorial capaz de impor suas teses retrógradas. 

Esses hoje se veem fortalecidos pelo fato que o referido avanço da evolução das consciências humanas  não acompanhar no mesmo compasso evolutivo as contradições causadas pelo limite interno e externo do capitalismo que se torna inadministrável  pelos bem-intencionados progressistas, termo que até pouco tempo se atribuía à esquerda.  

O avanço da direita conservadora decorre da incapacidade dos seus adversários em dar, pelo Estado e pela política, sentido humano à relação social capitalista no seu estágio de ocaso irreversível, como se os primeiros fossem - e não são! - capazes de administrá-lo corretamente e com pulso.     

O discurso da direita se trata de uma cantilena de fôlego curto que a força militarizada estatal em obediência a governantes ditatoriais tende a se desacreditar diante da insatisfação popular crescente, mas que produz efeito momentâneo diante da desesperança, principalmente nos países economicamente desenvolvidos ou em desenvolvimento que ora veem lhes faltar chão.  

A direita pode até estar presente tanto na democracia burguesa, com um bilionário capitalista igual Donald Trump, ou em propostas supostamente revolucionárias como na Coreia do Norte, com sua dinastia familiar hoje representada por Kim Jong-Un, para ficarmos apenas num exemplo de deturpação dos ideais revolucionários.   

Exemplo claro do movimento pendular de desgaste se pode observar nos repetidos ciclos de alternância política entre conservadores e social democratas graças à insatisfação popular a cada período por conta da queda paulatina de poder aquisitivo e perda de direitos sociais - principalmente previdenciários, comuns no mundo inteiro -, conforme se pode inferir dos dados abaixo: 

Na Inglaterra, após o período dos conservadores Margaret Thatcher e John Major, de 1979 a 1997, 18 anos, veio o período dos trabalhistas Tony Blair e Gordon Brown de 1997 a 2010, 13 anos; após o período dos conservadores David Cameron, Theresa May, Boris Johnson e Rishi Sunak de 2010 a 2024,14 anos;  e agora com o início de novo período trabalhista em 2024 com Keir Starmer. 

Na França, a direita avançou no primeiro turno das últimas eleições parlamentares e foi necessário uma unificação para que os partidos do campo da esquerda evitassem a hegemonia da extrema direita. Mesmo assim, o campo da esquerda conseguiu apenas 182 duas cadeiras em meio às 577 existentes, ou 31,5%. O centrão de lá, com Emmanuel Macron, continua dando as cartas.  

Nos Estados Unidos, Lyndon Johnson, democrata, foi sucedido por Richard Nixon, republicando, que renunciou ao cargo e foi sucedido por Gerald Ford, também republicano; na sequência vêm Jimmy Carter, democrata; Ronald Reagan, republicano; George H. W. Bush, republicano; Bill Clinton, democrata; George W. Bush,  filho, republicano; Barack Obama, democrata; Donald Trump, republicano; Joe Biden, democrata, e por aí vai.   

Por sua vez, a socialdemocracia e suas variantes mais progressistas ou não, tal como os conservadores, não podem responder aos anseios dos eleitores diante de fenômenos como a falência do Estado que decorre da depressão econômica mundial, e todos pugnam em seus discursos pela retomada do desenvolvimento econômico, impossível de ser retomada por conta das contradições internas dos fundamentos capitalistas que agora atingem seu ápice irreversível.    

As estruturas institucionais políticas de poder, serviçais de uma relação social negativa de onde tiram os seus sustentos, estão presas em camisas de forças que as impedem de pensar fora da caixa, ou seja, simplesmente pensar: entender e admitir que pode haver uma forma de relação social não atrelada ao sistema produtor de mercadorias, e mais, que é urgente tal alternativa porque é a humanidade que está em risco como espécie. 

O torpor cultural introjetado nas mentes humanas precisa ser rompido, porque se a ditadura burguesa não tem respostas, a democracia burguesa também não as tem, senão vejamos: 

- de que democracia estamos falando quando vivemos sob a égide de uma relação social antidemocrática por natureza, ou seja, em que é justificada e legal a apropriação forçada da produção social de capital pelo e para o capital com sua extração de mais-valia?!; 

- permanentemente fazemos a transferência de responsabilidade para prepostos políticos que recebem procurações para governar e legislar a cada ciclo eleitoral no qual tudo se repete e os outorgantes são relativamente alheios aos atos do outorgado; 

- permanentemente nos curvamos aos ditames ditatoriais de uma lógica abstrata, tautológica, que comanda o concreto da vida real, e que nos obriga ao cumprimento de regras absolutistas de atendimento a uma funcionalidade social comportamental vazia de sentido humano e de solidariedade, em que, por exemplo, se queimam produtos alimentícios para não prejudicar preços no mercado, cujo único objetivo é a valorização de si mesmo, do valor, que os eleitores não sabem o que é, pra que é, e nem como é.  

A democracia burguesa é antidemocrática - se quisermos emprestar ao termo um sinônimo de soberania da vontade popular - e não é o antônimo da ditadura, mas apenas uma variante pretensamente humana do desumano, e é por isso mesmo que se desgasta ensejando ciclicamente a aceitação perniciosa das pretensões do autoritarismo e conservadorismo oportunista.  

Ao povo deve caber o ônus e o bônus de suas decisões ao assumir de forma não representativa a solução dos seus próprios problemas sociais tendo como norte seu próprio interesse e sob bases equânimes de produção social e distribuição.  

Simples assim! (por Dalton Rosado)

Fonte: CELSO LUNGARETTI
A VISÃO DEMOCRÁTICA (POR CELSO LUNGARETTI )