Comando Vermelho em Rondônia: como uma fuga revelou o colapso da segurança prisional

O cenário da segurança pública em Rondônia atingiu um ponto crítico após uma série de eventos que expuseram as graves fragilidades do sistema prisional do estado. O caso mais emblemático, que culminou com a morte do cabo da PM Fábio Martins, começou com uma fuga aparentemente rotineira, mas revelou uma teia complexa de falhas estruturais e organizacionais.
No dia 2 de dezembro de 2023, Rodrigo Thierre, integrante do Comando Vermelho (CV), protagonizou uma fuga do presídio Urso Panda, em Porto Velho, utilizando um método rudimentar: o serramento das grades de sua cela. O que poderia ser visto como um incidente isolado transformou-se em uma tragédia anunciada quando, semanas depois, Thierre participou do assassinato do cabo Martins no Residencial Orgulho do Madeira.
"O sistema penitenciário é tratado como o patinho feio da segurança pública", desabafa um policial penal que pediu anonimato, revelando que a categoria está há mais de 14 anos sem concurso público. A situação é agravada pela chamada "portaria do silêncio", uma determinação da Secretaria Estadual de Justiça (Sejus) que impede os servidores de divulgarem informações cruciais sobre fugitivos.
O presidente do Sindicato dos Policiais Penais de Rondônia (Singeperon), Clebes Dias Ferreira, alerta para o risco iminente: "Sem melhorias estruturais e aumento de servidores, estamos todos correndo risco de vida, dentro dos presídios e, cada vez mais, nas ruas."
A escalada da violência em Rondônia não é um fenômeno isolado. Em fevereiro de 2024, uma rebelião no Acre forçou a transferência de lideranças do CV para Mossoró (RN), de onde posteriormente protagonizaram a primeira fuga de uma penitenciária federal na história do país. Em seguida, como em um efeito dominó, 13 detentos ligados à mesma facção escaparam da Casa de Detenção de Pimenta Bueno.
A articulação do crime organizado ficou ainda mais evidente com a prisão de Edsandra Costa da Silva, conhecida como "Vitória do CV", no Acre. Sua participação no assassinato do cabo Martins demonstra como a facção utiliza estados vizinhos como bases operacionais, aproveitando-se das vulnerabilidades do sistema.
O desfecho trágico dessa sequência de eventos veio com a morte de Thierre em confronto com a Polícia Militar no último domingo (26). Contudo, sua breve liberdade já havia custado vidas e exposto uma verdade inconveniente: o sistema prisional de Rondônia, sem investimentos adequados e com efetivo insuficiente, transformou-se em uma base operacional involuntária para o crime organizado.
A ausência de transparência, simbolizada pela "portaria do silêncio", apenas agrava o problema. "A sociedade deveria receber de imediato, pela imprensa, a foto de cada bandido que foge. É seu direito para se proteger", argumenta um servidor do sistema prisional, evidenciando como a política de contenção de informações pode estar colocando vidas em risco.
Enquanto medidas efetivas não forem tomadas, incluindo a realização de concursos públicos, melhorias estruturais e maior transparência nas informações, Rondônia continuará enfrentando as consequências de um sistema prisional que, ao invés de conter, involuntariamente facilita a atuação do crime organizado.