Absolvições por clemência, sumária e de réu confesso reacendem debate sobre o Tribunal do Júri em Rondônia

26 de outubro de 2017 1076

Profissionais do Estado abordam as facetas do Júri

Texto, edição, entrevistas e reportagem: Vinicius Canova
Fotografias: Gregory Rodriguez 

Porto Velho, RO – No dia 20 de julho de 2017 o advogado Giuliano Toledo Viecili, ex-vereador de Candeias do Jamari, comemorou em sua página particular no Facebook numa postagem aberta ao público:

“Depois de tantas batalhas, hoje nossa atuação no Tribunal do Júri conquistou a absolvição de réu confesso! Parabéns, meu amigo Wladislau [Kucharski]”.


Viecili: “A gente costuma falar no Tribunal do Júri que ninguém pode dizer 'nunca vou matar'”

A maior parte das reações, claro, manifestou apoio ao contato. Ao destoar, uma delas, no entanto, chamou a atenção em meio a tanta celebração e cumprimentos. 

“Sim, e daí? Foi legítima defesa? Só assim uma absolvição para um réu confesso. Não estou entendendo” – ecoou comentário solitário, que ficou sem resposta. Aliás, sem resposta até a publicação desta matéria.

A mais de 700 quilômetros de Porto Velho e somente cinco dias depois do primeiro fato, a Defensoria Pública de Rondônia (DPE/RO) exaltou absolvição por clemência promovida pelo Júri em favor de um homem acusado de matar duas pessoas após bebedeira. 

Avançando mais um pouco ao sul no mapa, em abril deste ano a pacata cidade de Cerejeiras sentiu o baque de uma das tragédias mais bárbaras e, consequentemente, revoltosas dos últimos tempos: o Caso Jéssica. 

Tanto é que ressoou Brasil afora, alcançando os noticiários nacionais. O inusitado aqui, em contrapartida, é que o principal acusado de cometer tamanha crueldade, namorado da vítima assassinada com treze facadas, foi absolvido sumariamente na sentença de pronúncia, algo raríssimo em quaisquer situações envolvendo crimes dolosos contra a vida, justamente os de atribuição do crivo do Tribunal Popular. Quando há repercussão midiática e social, então, nem se fala.

Em setembro, o repórter Vinicius Canova escreveu artigo intitulado “Caso Jéssica Hernandes – Os acusados. Os carrascos. O juiz. O ser humano. O inocentado. As reviravoltas”. No texto, abordou a celeuma trazida à baila após a decisão proferida pelo juiz de direito Jaires Taves Barreto, da 2ª Vara Criminal de Cerejeiras.


“Não é porque o sujeito confessou o crime que será condenado, pois existe uma coisa chamada excludente de ilicitude. No Direito, nada é absoluto: nem a vida”, diz criminalsita

Três situações distantes aproximadas apenas pelo cordão umbilical da temática. Afinal, o Conselho de Sentença, composto basicamente por pessoas leigas, teoricamente sem conhecimento técnico na área do Direito, tem ou não condições plenas de definir os rumos de uma vida sob o jugo do malhete?

Imperioso destacar antes de responder ao questionamento que há casos emblemáticos de iniquidade escrachada proporcionados por juízes togados, ou seja, formados e referendados dentro das suas respectivas áreas de atuação. 

No início do Estado Novo (1937-45), historicamente denominado como “A ditadura de Getúlio Vargas”, fora deflagrado também um dos casos mais célebres de injustiça e erro Judiciário do Brasil: a saga penitente dos irmãos Naves (clique aqui e leia a íntegra). 

Outro exemplo bem mais recente é o do índio Galdino Pataxó, incendiado vivo em 1997 por cinco rapazes, entre eles um menor, enquanto dormia em uma parada de ônibus em Brasília, Distrito Federal (DF). 

A juíza, na pronúncia, desclassificou o delito de homicídio doloso qualificado para lesões corporais seguidas de morte, sendo que o Tribunal de Justiça do DF, apreciando o recurso do Ministério Público (MP), manteve a decisão desclassificatória. 


"Comigo não tem circo. O jurado percebe quando o advogado está fazendo presepada ou mesmo situações onde o promotor quer aparecer. Ele sabe diferenciar", assevera promotor do Júri 

Após idas e vindas recursais, finalmente o quarteto que já usufruía da maioridade penal caiu no Tribunal do Júri, sentenciando a trupe em novembro de 2001 a 14 anos de prisão, sentença cumprida deficientemente através de cotidiano cheio de regalias e amontados de vistas grossas. 

A rapaziada tentou justificar a barbárie à época: eles imaginavam que Galdino seria um mendigo e informaram que “apenas” queriam brincar com ele.

Esses arquétipos demonstram, no mínimo, que tecnicidade não vincula, necessariamente, fato concreto à decisão coerente.  Verdade seja dita, este nexo causal é observado regularmente no ímpeto de imperitos que atuam corriqueiramente no Conselho de Sentença. 


“Você provavelmente será condenado”, informou defensor público a assistido absolvido por clemência em Vilhena (Foto: arquivo pessoal)

Voltando às situações rondonienses. Viecili conversou com o jornal eletrônico Rondônia Dinâmica revelando como seu cliente, um réu confesso, fora absolvido mesmo admitindo o crime, expondo minúcias do processo e suas perspectivas acerca do desfecho; além disso, o criminalista Alexandre Batista, professor universitário, complementou e expôs considerações sobre o Tribunal do Júri e os desdobramentos infligidos pelo Judiciário a todos os atores envolvidos. 

O defensor público George Barreto Filho relatou exclusivamente e com riquezas de detalhes pormenores a respeito da absolvição por clemência concedida no seio dos rincões vilhenenses, onde tanto assistido (nome técnico dado a quem recebe assistência da DPE) quanto ele próprio se surpreenderam com o resultado final. 

Por fim, o promotor de Justiça Ademir José de Sá, que trabalha na Capital, esmiuçou sua percepção como integrante do Ministério Público de Rondônia (MP/RO) em relação às atuações da instituição e exprimindo opiniões no tocante à atmosfera jurídica.

Acesse

 

O professor criminalista especialista em Tribunal do Júri relata, numa longa conversa – e de maneira pedagógica – como funciona a logística voltada ao instituto. Ele participou de mais de cem e, depois disso, parou de contar.

É possível absolvição de réu confesso? E por clemência? O denunciado pode ser absolvido sumariamente pelas próprias mãos do juiz?

Todas essas perguntas são respondidas e o causídico vai além ao apresentar críticas à imprensa em relação ao sensacionalismo panorâmico em torno de casos de ampla repercussão; quais foram e ainda são as consequências de um episódio onde um promotor mostrou uma arma em Plenário a fim de intimidá-lo e muitas outras explicações.

 

VISÃO PERIFÉRICA

POR: VINICIUS CANOVA